Silessauro foi descoberto em sítio paleontológico gaúcho e preenche “lacuna” na evolução de animais jurássicos
Uma nova espécie pré-histórica foi descoberta em Restinga Sêca, município da região central gaúcha, a quase 60 quilômetros de Santa Maria, e pode ajudar a explicar a origem dos dinossauros, segundo pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). O animal inédito preenche “lacunas” na evolução de espécies pré-históricas e viveu há 233 milhões de anos atrás.
O trabalho que identificou o fóssil, que é de um silessauro, réptil ancestral do Período Triássico, que ocorreu entre 245 e 205 milhões de anos atrás, foi publicado na última terça-feira (11) no periódico Scientific Reports, da editora Nature. Os autores são os paleontólogos Rodrigo Müller, chefe do Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica (Cappa) da UFSM, e Maurício Garcia, doutorando na universidade.
Hoje, há um debate se silessauros são uma família próxima dos dinossauros ou se são dinossauros verdadeiros, isso porque ambos os animais mantêm semelhanças ósseas. Agora, o achado dos pesquisadores reforça a hipótese de que os silessauros fazem parte do grupo e que eles seriam os ancestrais dos ornitísquios, dinossauros herbívoros conhecidos por terem chifres e armaduras.
— É um espaço temporal em que estão surgindo os primeiros dinossauros e se acreditava que os silessauros teriam sofrido por essa competição, com animais que no início eram maiores em tamanho e que teriam diminuído na medida em que os dinossauros surgiam. O fóssil que encontramos derruba essa hipótese — explica Müller.
Na época, esses animais não eram grandes como nos filmes e desenhos animados, que retratam dinossauros jurássicos, período que se iniciou a cerca de 200 milhões de anos atrás, após o Triássico e a extinção dos silessauros. As dimensões dessas espécies pré-históricas são próximas às de um cachorro de médio porte. Fósseis triássicos encontrados na região central gaúcha costumam ter cerca de meio metro de altura e por volta de 1,4m de comprimento, diz Müller.
— Nos anos 90, se falava muito em formas primitivas e outras mais evoluídas de dinossauros. A partir de novos achados, de 2003 para cá, vemos que esses animais "mais arcaicos" não só coexistiram com dinossauros, como agora também vemos que eles não reduziram de tamanho e continuaram existindo — afirma o paleontólogo.
Lagarto-da-chuva ancestral
A descoberta da nova espécie foi feita a partir de duas porções de dois fêmures, justamente o osso, da perna, que demarca diferenças essenciais entre as espécies de répteis pré-históricos. Com isso, foi possível confirmar que o animal se tratava de um silessauro até então desconhecido.
— É um fóssil com estruturas que têm aspecto transicional entre formas mais antigas e outras mais avançadas de fêmur, então podemos rastrear a evolução dessas características. Além disso, tem a questão ecológica, que mostra que os silessauros eram maiores que o esperado — explica Müller.
A nova espécie foi batizada de Amanasaurus nesbitti. O primeiro nome significa “lagarto-da-chuva” (“amana” é “chuva” em tupi e “saurus”, “lagarto” em grego), enquanto “nesbitti” é uma homenagem ao pesquisador norte-americano Sterling Nesbitt, um dos principais paleontólogos do mundo na área de silessauros e dinossauros primitivos.
Os restos foram encontrados no sítio fossilífero de Pivetta, localizado próximo do limite de Restinga Sêca com o município de São João do Polêsine. O local está inserido no geoparque Quarta Colônia, uma região de nove municípios que concentra patrimônios geológicos de importância global, como fósseis e rochas de milhares de anos atrás.
— Temos alguns dos dinossauros mais antigos do mundo, uma fauna triássica preservada e cada vez mais vemos fósseis que ajudam a gente a preencher o “quebra-cabeças” evolutivo. Coisas que encontramos aqui, mas que não estão em outros lugares — diz o paleontólogo.
Na época em que o lagarto-da-chuva caminhou pelo atual Rio Grande do Sul, os continentes estavam todos concentrados em um mega-continente chamado Pangeia e o que hoje é o Estado dividia seu território com uma área da atual Namíbia, país do oeste africano. Por isso, algumas das espécies do Período Triássico encontradas por aqui também são identificadas em outras partes do planeta.
Nessa era antiga, plantas angiospermas, como árvores frutíferas ou flores, sequer haviam surgido, assim como a grama. O chão, explica Müller, provavelmente era coberto por musgo e o bioma era florestal, com muitas chuvas e corpos d’água. Por isso, com base no que se sabe sobre outros silessauros, a hipótese é que o lagarto-da-chuva se alimentava de plantas, insetos e pequenos animais vertebrados.
Fósseis podem ser visitados sem custo
O estudo de Müller e Garcia recebeu apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (Fapergs).
Os fósseis do Amanasaurus nesbitti estão depositados na sede do Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica (Cappa) da UFSM, em São João do Polêsine, município a 46 quilômetros de Santa Maria e a 266 quilômetros de Porto Alegre. Uma série de outros fósseios também está exposta no local, que pode receber visitações sem custo.
0 Comments: